Como o ditado sabiamente refere, a única constante da vida é a mudança. O mesmo se aplica à vida das empresas e do mercado de trabalho. Seja para se manter competitiva, porque houve uma fusão entre empresas ou até mesmo devido a fatores como uma crise ou uma pandemia, a mudança está sempre presente no quotidiano das equipas. O contexto que vivemos nos últimos anos colocou-nos na primeira fila de uma das maiores mudanças nas organizações a nível mundial. Mas, será que as empresas portuguesas estão prontas para o que aí vem?
Tipos de mudança
As organizações mudam essencialmente de duas formas: através da adaptação evolutiva ou devido a medidas drásticas. A primeira ocorre de forma gradual e planeada, sendo o método de eleição das empresas quando pretendem levar a cabo uma transformação eficaz. Normalmente, os líderes que optam por esta abordagem focam os seus esforços em derrubar as normas predominantes, começando por marcar a diferença nas pequenas coisas de maneira segura, dando eles próprios o exemplo e inspirando, assim, os seus colegas. Já as mudanças mais radicais, são muitas vezes fruto de pressões externas às organizações. Seja por uma transformação a nível político, legal, tecnológico ou até mesmo devido a escassez ou abundância de recursos essenciais, este tipo de disrupção acontece normalmente de forma rápida, levando sempre a uma maior resistência por parte dos intervenientes.
Podemos apontar como exemplo de uma mudança radical o momento que atravessamos atualmente, devido à pandemia à escala mundial propulsionada pela Covid-19. As empresas de todo o mundo tiveram de passar por uma mudança extremamente drástica. Muitos trabalhadores e líderes tiveram de se adaptar ao trabalho remoto e às novas exigências da sociedade. O mundo e a economia pararam de forma literal. De um dia para o outro, vimo-nos obrigados a permanecer confinados em casa, mudámos hábitos tidos como adquiridos e tivemos de terminar com qualquer tipo de contacto social.
O teletrabalho, algo há muito desejado pelos trabalhadores e temido pelas organizações, tornou-se na nova norma. Múltiplas empresas portuguesas viram-se obrigadas a colocar os seus trabalhadores em trabalho remoto de imediato, mesmo não estando preparadas para tal. Apesar de ter sido uma mudança drástica na forma de trabalhar e que poderia ter corrido mal, esta transformação acabou por ser extremamente bem sucedida. De acordo com um estudo recente, três em cada cinco empresas em Portugal não tinham uma política de trabalho remoto, contudo em 45% dos casos o volume de trabalho acabou por aumentar, assim como a capacidade de resposta da direção. Esta situação conduziu a que 95% dos portugueses queira continuar a trabalhar a partir de casa pelo menos um dia por semana no cenário pós Covid-19.
Dificuldades na mudança
Quando é necessário levar a cabo uma mudança organizacional, os gestores, normalmente, seguem a seguinte fórmula: começam por renovar a estratégia da empresa e, posteriormente, focam-se em alterar os colaboradores, realinhar os incentivos económicos e eliminar as ineficiências nos processos. Contudo, conforme os diferentes casos partilhados na literatura, a mudança acaba por não ocorrer tão bem como esperado, já que a maioria das pessoas sente relutância em modificar a sua forma de agir. Se funcionou no passado, porque não continuar a fazer da mesma forma? Um estudo de 2015 levado a cabo pela empresa McKinsey, apontou que somente 26% dos programas de mudança são bem sucedidos.
A maioria destes esforços para transformar as organizações acabam por não resultar, pelo facto de serem baseados numa teoria da mudança que é, fundamentalmente, imprecisa. Esta assenta na noção de que se deve começar por mudar as atitudes dos indivíduos, já que ao fazê-lo estaremos a modificar os seus comportamentos. As mudanças nos comportamentos individuais, quando repetidas por muitas pessoas, irão então, mudar os comportamentos organizacionais. Pode-se afirmar que este modelo funciona quase como uma conversão a uma religião. Quando as pessoas se “convertem”, espalham essa crença que se dissemina por toda a empresa.
Contudo, a verdade é que o comportamento de cada indivíduo, acaba por ser fortemente influenciado pelos papéis organizacionais que desempenha. Desta forma, apostar em colocar as pessoas num novo contexto organizacional que lhes imponha novos papéis, responsabilidades, relações e, consequentemente, atitudes e comportamentos, será a melhor forma de conduzir com sucesso uma mudança a nível organizacional.
Mesmo implementando um grande programa de mudança, os gestores correm sempre o risco de cometer algum erro. De seguida, apresentamos os mais comuns, segundo John P. Kotter:
Não estabelecer um sentido de urgência importante o suficiente - Mais de metade das empresas que promovem programas de mudança falham nesta primeira fase. Conseguir comunicar eficazmente as razões que levam a organização a querer mudar influencia fortemente a motivação das pessoas para efetivamente mudarem os seus comportamentos. É importante não subestimar a dificuldade de guiar as pessoas a saírem fora da sua zona de conforto.
Não criar uma coligação suficientemente poderosa - Nas transformações bem sucedidas, tanto em pequenas como grandes empresas, a equipa inicial pode ser composta por poucos membros que partilham a crença na mudança. Porém, à medida que o tempo vai passando, é importante que esta coligação vá crescendo e vá contendo uma diversidade em termos de títulos, especializações, reputações e relacionamentos. É, igualmente, importante que este grupo seja incentivado a trabalhar como equipa e fora dos limites hierárquicos normais.
Falta de visão - A visão é algo que ajuda a clarificar a direção que a organização pretende tomar. Após esta visão estar bem definida, a estratégia surge. Contudo, se não for possível comunicar a mesma em cinco minutos de modo a obter uma reação positiva do interlocutor, significa que esta fase ainda não está devidamente concretizada.
Não planear nem criar vitórias a curto prazo - A transformação a nível organizacional é algo que leva o seu tempo e como tudo o que é demorado, pode conduzir a sentimentos de frustração e a que se desista. Desta forma, é importante manter as pessoas motivadas através de pequenas vitórias a curto prazo. Os gestores devem procurar ativamente formas de melhorar o desempenho, estabelecendo objetivos e recompensando os intervenientes quando os mesmos são atingidos. Declarar vitória demasiado cedo - Apesar de celebrar as vitórias ser algo positivo, é importante não cair na tentação de declarar a guerra como ganha antes do tempo. É necessário que as mudanças se integrem na cultura da empresa, processo esse que pode demorar anos ou até décadas. Os líderes devem, sim, utilizar essas vitórias a seu favor, que conferem credibilidade aos seus programas de mudança, para mudarem sistemas, estruturas e políticas que podem comprometer a visão.
Liderar a mudança
O processo de mudança não é só difícil para os indivíduos que necessitam de mudar. Quem está responsável por liderar a mesma, de forma bem sucedida, não tem uma tarefa fácil. Apesar de, frequentemente, se encarar o trabalho dos líderes como algo inspirador e a liderança como algo fantástico e até glamoroso, tentar conduzir uma organização por uma mudança tem os seus riscos.
Liderar é ter a capacidade de fornecer notícias por vezes incómodas e de levantar questões difíceis, de maneira a incentivar as pessoas a compreenderem a mensagem, sem quererem matar o mensageiro. Os líderes correm, assim, o risco de serem mal interpretados e até incompreendidos por parte dos restantes indivíduos. Não é possível apenas colher os bons frutos da liderança sem experienciar alguns momentos mais dolorosos. Porém, vale a pena manterem-se no jogo já que serão recompensados com o facto de poderem observar as mudanças positivas que proporcionam à vida dos outros e até conferirem algum significado às suas próprias vidas.
Como já percebemos, os programas de transformação mais eficazes requerem que as pessoas estejam informadas e motivadas para a mudarem. Neste sentido, é importante que os líderes criem e levem a cabo uma campanha de persuasão que pode começar semanas ou até meses antes do plano efetivo. Greg Satell, autor do famoso livro Cascades: How to Create a Movement that Drives Transformational Change, indica alguns passos importantes que os líderes devem ter em consideração para serem bem sucedidos nos seus esforços:
Passo 1: Comece por um grupo pequeno: É importante começar por apresentar claramente os objetivos da mudança. Todavia, é também necessário que exista um pequeno grupo coeso que partilhe estas crenças e acredite nas mesmas, de forma a ser mais fácil lidar com a oposição que todos os programas, inevitavelmente, enfrentam.
Passo 2: Identifique uma mudança inicial: A identificação de uma mudança basilar que represente um objetivo tangível e envolva múltiplos stakeholders é crucial de forma a motivar os intervenientes a estarem recetivos a outras mudanças.
Passo 3: Reúna aliados para a sua causa: Todas as transformações bem sucedidas juntam a força de um bom líder com o apoio de diversos intervenientes. É, assim, importante conseguir atrair uma rede de membros que partilhem a sua motivação e ajudem a propulsionar todo o movimento.
Passo 4: Sobreviva à vitória: Como vimos anteriormente, declarar vitória demasiado cedo poderá ser um grande erro. É necessário saber continuar o processo até que mudança esteja, definitivamente, entranhada na cultura da organização.
Nas palavras de Jean-Baptiste Karr, plus ça change, plus c'est la même chose (quanto mais se muda, mais se permanence igual - tradução livre). No entanto, como abordámos ao longo do texto, esta máxima pode ser evitada pelas organizações, caso estas optem por levar a cabo um programa de mudança bem conseguido. Seja ela uma mudança planeada e gradual, em que se conseguem evitar e antecipar os problemas, seja uma mudança mais drástica impulsionada por fatores externos, cabe aos líderes saberem aproveitar e jogar estas oportunidades a seu favor e das organizações que comandam.