Quantas e quantas vezes acordamos e vamos direitinhos ao nosso telemóvel verificar o email ou as notificações das redes sociais? Quando estamos à espera de uma consulta ou numa fila, quantas pessoas estão a olhar para os telemóveis? Já não sabemos estar “sem fazer nada”, nem aproveitar os momentos mortos. Temos uma constante necessidade de ser produtivos, de estar a responder a alguém e a saber o que se passa. Uma das nossas maiores preocupações passou a ser o medo de não saber o que se passou ou FOMO (fear of missing out). E quanto tempo estaremos de facto a perder com este receio de perder tempo?
Todos sabemos que a Internet e as redes sociais, em particular, trazem imensos benefícios. Permitem estarmos conectados com o mundo, que saibamos aquilo que se passa de importante (ou não) noutras cidades e países, que não nos percamos na estrada quando vamos para um destino novo, que exploremos o nosso padrão de sono, batimentos cardíacos, entre muitas outras regalias que todos conhecemos. Mas com o passar dos anos, os seus perigos têm-se tornado mais evidentes e difíceis de ignorar.
Estarás viciado?
Já tentaste passar uma semana sem usar redes sociais? Ou até um dia? Se achas que não consegues passar sequer uma hora sem estar conectado, podes estar a experienciar sintomas de adição. Podemos defini-la como um estado em que uma pessoa se encontra quando tem um comportamento no qual os efeitos recompensadores são um incentivo à repetição desse mesmo comportamento, apesar dos efeitos negativos que pode provocar. Por outras palavras, é um comportamento que tem um resultado tão gratificante que mesmo que faça mal, nós continuamos a perpetuar.
Ora, como alguns livros e documentários têm procurado alertar, no mundo das redes sociais nada é por acaso. As empresas que detêm estas aplicações possuem grandes mentes que trabalham todos os dias de forma a tornarem estas mesmas aplicações mais irresistíveis para os seus utilizadores. Claro que não podemos comparar o poder aditivo das tecnologias ao do uso de substâncias como as drogas, no entanto os seus efeitos podem ser bastante nocivos para a nossa saúde. Por exemplo, ter o Facebook sempre à mão e à distância de um clique pode tornar muito difícil resistir ao impulso de ir verificar o que se passa por lá várias vezes durante o dia. A isto podemos chamar de um comportamento de adição moderado. Isto é precisamente aquilo que quem desenha estas aplicações pretende que tenhamos através de reforços positivos intermitentes e do nosso desejo de aprovação social.
Os reforços positivos intermitentes demonstram como as recompensas que são atribuídas de forma imprevisível são muito mais tentadoras do que aquelas que já sabemos quando iremos receber. Esta é a lógica por detrás dos jogos de casino e das próprias redes sociais. Quando abrimos o nosso feed de notícias nunca sabemos o que vamos encontrar e com um novo swipe é-nos apresentado todo um novo conjunto de estímulos. Também as notificações vermelhas que temos no canto das aplicações são desta cor em sinal de alerta, de forma a sentirmos uma urgência em ver o que se passa. Quando não lhes damos atenção é como se estivéssemos a ignorar um alerta de alguém da nossa “tribo” (não esquecer que o nosso cérebro ainda não saiu da era pré-histórica). O mesmo se aplica aos likes, quando alguém “gosta” da nossa foto temos um sentimento de aprovação e pertença por parte da tribo. Quando temos menos do que esperávamos, sentimos que não pertencemos ou que estamos a ser ignorados.
O lado negro das redes sociais
Vários estudos têm apontado para o aumento de problemas de saúde mental principalmente ansiedade) em jovens que acompanham a proliferação do uso das redes sociais. Estes problemas afetam em particular a geração nascida a partir de 1995 e têm uma maior incidência após 2011, altura em que as redes sociais tiveram o seu “boom”. Para além de estarem a afetar a nossa saúde, têm ainda afetado a nossa (já instável) coesão social. Escândalos como aquele que envolveu a Cambridge Analytica e o Facebook nas eleições que conduziram ao Brexit começam a levantar questões sobre o uso dos nossos dados pessoais por parte destes monopólios corporativos.
Se pensarmos bem, apesar de estarmos cada vez mais conectados, os sentimentos de solidão e de alienação social são cada vez mais comuns e debatidos na esfera pública. A busca pela vida perfeita têm profundos impactos no equilíbrio não só de quem vê as publicações, como também em quem as publica. Uma segunda dicotomia a apontar é que, apesar de as tecnologias nos darem uma sensação de sermos mais livres para trabalharmos onde e como quisermos, a verdade é que acabamos por nos sentir mais presos e consumidos pelo mundo digital.
O minimalismo digital
Em resposta a esta necessidade de nos libertarmos destes efeitos provocados pelo uso constante das redes sociais, surge esta filosofia que Carl Newport explora em detalhe no seu livro com o mesmo nome. Este define-a como sendo a filosofia sobre o uso da tecnologia em que o foco do tempo passado online está num pequeno número de atividades seletas que vão ao encontro de coisas que valorizamos.
Na prática, implica fazermos uma análise do custo-benefício que determinada aplicação irá trazer à nossa vida. Se o benefício compensar o custo de vida gasto a usá-la então é uma boa opção. Por exemplo, as tecnologias permitem-nos estar informados sobre diferentes tópicos. Em vez de estarmos subscritos a inúmeros sites e aplicações de informação que nos podem sugar numa espiral de novas notícias, podemos selecionar alguns artigos que nos interessem e lê-los mais tarde com a internet desligada através do nosso tablet. Esta seria uma forma otimizada de utilizarmos a tecnologia sem que percamos o controlo.
Checklist para o uso da tecnologia:
Segundo esta filosofia uma tecnologia valerá a pena se:
Servir algo que valorizamos;
For a melhor maneira de usar a tecnologia para o propósito em específico;
Tiver um papel na nossa vida bem definido e que responda a quando e como deverá ser usada.
O autor sugere ainda um programa de desintoxicação digital de 30 dias como a melhor forma de quebrarmos a dependência para com as redes sociais. No final do mesmo, todas as tecnologias que voltarem deverão passar nas questões da checklist acima mencionada. No entanto, se não pretenderes um corte tão radical, sugerimos algumas dicas para minimizares o seu uso e consequentemente os seus impactos negativos:
Escolhe bem as fontes de conteúdos que consultas. Por exemplo, se sentes a necessidade de estar sempre informado/a do que se passa no mundo, existem aplicações e sites que ajudam a filtrar as notícias e a fazer uma leitura mais equilibrada das mesmas. Em vez de consultares vários sites de notícias (muitas vezes enviesadas), podes usar o Allsides.com que faz um apanhado das notícias mais importantes presentes em jornais de direita, esquerda ou neutros.
Desliga as notificações no telemóvel. Se não consegues estar sem receber as notificações no Whatsapp, tenta pelo menos retirar do Instagram ou do Facebook. Começa com pequenos passos que irão fazer toda a diferença.
Tira o som do telemóvel enquanto trabalhas ou fazes outra tarefa que exija concentração. Vais ver que depois de o fazeres até te esqueces que tens telemóvel!
Bloqueia o acesso a determinados sites durante algum tempo. Se tens mais dificuldade em resistir, este tipo de aplicações poderão ajudar imenso a começares o teu processo de minimalismo digital. Sugerimos o Forest que te permite ires acompanhando o crescimento de uma árvore à medida que a utilizas. É uma boa app para quem gosta de monitorizar o tempo de estudo também!
Pega num livro quando sentires a necessidade de “dar só uma espreitadela no feed”. Vais ver que num instante terminas aqueles livros que tens na mesinha de cabeceira.
Começa um hobbie mais manual. Pintar, fazer bricolagem, compor uma mota ou jardinagem, são tudo actividades que podes fazer e que te vão trazer muito mais bem estar e felicidade no fim do dia.
As tecnologias no geral e as redes sociais, em particular, mudaram o nosso mundo. É inegável que estas nos ajudaram a ultrapassar grande parte dos desafios impostos pelo Covid-19 e a nos sentirmos mais próximos quando nos encontramos mais afastados. No entanto, como tudo o que está em exagero se torna nocivo, a nossa dependência para com este mundo digital está também a mudar o ser humano e a nossa sociedade. É importante sabermos aquilo que as grandes empresas por detrás destas aplicações estão a fazer ao tentarem modificar os nossos comportamentos de forma a beneficiarem economicamente, para que possamos tomar decisões mais informadas e que nos façam bem!
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